Lendo as recentes notícias sobre as dificuldades que a família brasileira tem enfretado para conseguir ver o menino Sean, da morte do avô materno e tudo o mais que tem envolvido este caso lembrei-me da cobertura daquele Natal de 2009 e de algumas histórias e percepções envolvendo os bastidores da disputa que por inpumeros motivos nunca foram tornadas públicas.
Para quem não está familiarizado com o caso, aí vai um pequeno resumo: Sean Goldman nasceu em 2000 nos Estados Unidos, filho do americano David Goldman e da brasileira Bruna Bianchi.
Quatro anos depois, a mãe voltou para o Brasil com o menino. O pai ficou nos Estados Unidos e teve início uma pendenga judicial pela guarda definitiva de Sean, conquistada pela mãe na Justiça Brasileira. Bom, Bruna Bianchi se casou de novo com João Paulo Lins e Silva, de quem ficou grávida, mas morreu no parto da filha realizado na Casa de Saúde São José, tida como uma das melhores maternidades cariocas.
Depois da morte de Bruna, David Goldman entrou na justiça em busca da guarda definitiva do menino, então com 9 anos. Procurou jornais e programas de televisão americanos. O caso ganhou tal repercussão que acabou virando uma espécie de pendenga diplomática com o envolvimento até mesmo da secretária Hillary Clinton.
Bom, fiz este pequeno resumo para lembrar aquele natal de 2009, quando saiu a decisão definitiva da justiça brasileira de que o menino deveria ser entregue ao pai. A sentença final saiu no dia 23 de dezembro. Era plantão de Natal e estávamos todos os jornalistas na porta do hotel onde estava hospedado David Goldman, na Praia de Copacabana.
Nas vezes que tinha vindo ao Brasil anteriormente, o pai de Sean sempre estava disponível para a imprensa brasileira. A maior dificuldade era mesmo conversar com a família brasileira de Sean. No entanto, desta vez, David Goldman se recusou a falar com qualquer jornalista brasileiro. Logo depois, soubemos o motivo: ele tinha fechado um acordo com a rede de tv americana NBC que pagava hospedagem, tinha fretado avião e arcado com todos os outros custos da viagem. Soubemos que seria produzido um grande documentário sobre o tema.
Diante desta nova dificuldade, decidi pegar uma tangente. Assim que saiu a decisão defintiva, liguei mais uma vez para Silvana Bianchi, avó materna de Sean e que até então tinha se mantido em silêncio, apesar das inúmeras tentativas minhas e toda a imprensa.
Desta vez, no entanto, ela atendeu. Com a voz bastante baqueada, contou que tinha decidido finalmente falar porque estava revoltada com a maneira como o caso estava sendo tratado pelas autoridades brasileiras. Silvana contou que não aceitaria gravar uma entrevista ao vivo, mas que eu poderia gravar a conversa pelo telefone.
Surpreendida com a anuência dela depois de tantas negativas e com medo de que ela desistisse se houvesse alguma interrupção, comecei a gravar "no improviso". Botei o telefone no viva voz e encostei o microfone.
Estava na porta do hotel cercada por jornalistas que logo que assistiram à cena correram para ver o que estava acontecendo. Era do jogo, estávamos todos lá fazendo a mesma cobertura e assim eles ouviram e "colaram" o depoimento da avó.
Assim que a ligação foi encerrada, um dos jornalistas que acompanhou toda a cena e que eu não conhecia me abordou: "você estava falando com quem?". "Com a avó materna de Sean", respondi. Ele me perguntou o que ela tinha falado e eu contei. Ele saiu e logo em seguida voltou acompanhado de outro jornalista americano com traços orientais que me fez as mesma perguntas, só que desta vez em inglês. Dei as mesmas respostas até que ele me perguntou se eu daria uma entrevista sobre isso para o jornalista da NBC que estava dentro do hotel e era responsável por fazer o tal documentário com o pai de Sean. Jornalista dar entrevista? É meio estranho, mas liguei para o meu chefe, ele disse que não via problemas e tudo bem, concordei.
Eis que então sai do hotel o tal jornalista americano acompanhado de um verdadeiro séquito de produtores, brasileiros e americanos, câmeras, iluminadores e afins. Cabelo grisalho, blaser, calça jeans, peito inflado no melhor estilo " eu sou o que vcs, tupiniquins, almejam ser". Nos cumprimentamos e ele me fez mais uma vez todas as perguntas que tinham sido feitas pelos assistentes. Respondi de novo até que ele me questionou: "Você falaria isso para mim no microfone?". Propus, então, uma troca: " Claro, falo, mas se você gravar comigo falando sobre o documentário que está fazendo. Qual a relação com David Goldman e como ele tem reagido às recentes decisões". Na hora, ele ficou ainda mais branco, a expressão em seu rosto dava conta de que ele parecia não acreditar no que na cabeça dele era uma "ousadia" tremenda. Imagine, uma jovem jornalista brasileira querendo o que ele quer?! Onde já se viu?! O tal pavão começou a balançar a cabeça fazendo o sinal de negativo e, enquanto fazia isso era cercado por outros jornalistas brasileiros afoitos por notícias de dentro do hotel.
Ele estava sendo bombardeado por perguntas e, perdido, parecia não saber o que fazer até que saiu correndo, literalmente, de volta para o hotel. Deixou a equipe para trás com cara de quem não entendeu nada, exceto pelos produtores brasileiros que exibiram um discreto sorriso de canto de boca.
No dia seguinte Sean Goldman embarcou no avião fretado pela NBC para os Estados Unidos. O endereço que segue abaixo dá acesso à esta matéria.
Passado mais de um ano do caso, confesso aqui, com a clareza que o tempo traz às percepções, que fiquei com uma enorme dor no coração pelo menino e com uma sensação de que ele ainda enfretaria muitos outros pavões, jornalistas ou não. Espero que esteja errada..
Endereço da matéria Sean Goldman embarca para os Estados Unidos
Exibida no dia 24/12/2009
http://bandnewstv.band.com.br/conteudo.asp?ID=245247&CNL=20